sábado, 31 de dezembro de 2022

Inovações e desafios do mundo globalizado - Parte 01

 O processo de globalização


Globalização

O termo “globalização’’ começou a ser empregado na década de 1980 e, na década seguinte, começaram a surgir os primeiros estudos sobre o tema. Apesar de complexo e controverso, o conceito de globalização pode ser descrito, em linhas gerais, como um processo econômico, social e cultural marcado pelo intenso inter­câmbio de capitais, produtos, serviços e informações por todo o planeta.


Conceito de globalização

Hoje, por exemplo, é possível estar no Brasil e conversar em tempo real com pessoas de Portugal, da África do Sul ou da China; comprar pela internet um produto alemão, fabricado na China com peças japonesas, que em poucos dias chegará à sua casa; assistir pela televisão a uma partida de futebol entre clubes europeus formados por jogadores brasileiros, argentinos, nigerianos e argelinos, além dos nacionais. Sob esse aspecto, a globalização favorece a interação de pessoas, comportamentos e costumes ao redor do mundo.


Globalização e o intercambio proporcionado pelo avanço tecnológico

Porém, não são quaisquer informações, mercadorias ou pessoas que transitam pelo mundo. Em geral, as mercadorias que circulam com mais facilidade são as que geram lucro, principalmente aos países desenvolvidos; as pessoas que circulam com maior liberdade são as que viajam a negócios ou a turismo, e não aquelas que decidem imigrar por necessidades ­econômicas. Do mesmo modo, a maioria dos comportamentos e valores difundidos no mundo são ocidentais, ou seja, dos Estados Unidos e dos países ricos da Europa.


Economia capitalista e a globalização



Jogadores do time de futebol francês Paris Saint-Germain (PSG) durante partida na cidade de Paris, França, em 2018. O time é composto de jogadores de diferentes nacionalidades.

A internet: propulsora da globalização


Mundo interligado - característica da globalização

Muitas mudanças trazidas pela globalização não teriam acontecido sem o desenvolvimento da internet. Nos anos 1960, o governo dos Estados Unidos, preocupado em vencer a corrida armamentista contra os soviéticos, encarregou a Agência de Projetos de Pesquisa Avançada do Departamento de Defesa (Arpa, em inglês) de desenvolver novas tecnologias para fins militares. Com esse objetivo, os pesquisadores criaram uma rede de dados e um software que permitiam conectar os computadores da agência.

Na década de 1980, a rede se expandiu e recebeu o nome de internet. Nos anos 1990, ela se tornou um sucesso comercial, sobretudo quando os europeus criaram a www (world wide web ou “rede mundial de computadores”). A expansão dos usuários da rede no mundo todo agilizou as comunicações e aproximou as pessoas, provocando mudanças profundas no comportamento, na linguagem e nas relações humanas.


A internet se tornou um sucesso comercial, sobretudo quando os europeus criaram a www (world wide web ou “rede mundial de computadores”).

Um exemplo recente do poder de mobilização de usuários da internet foi a campanha “#Argentina NoVayas”. Ela visava convencer a seleção argentina de futebol a cancelar o amistoso contra a seleção de Israel, que seria disputado em Jerusalém antes da Copa do Mundo de 2018. A iniciativa era um protesto contra a morte de centenas de palestinos pelo exército israelense na Faixa de Gaza. A campanha ganhou as redes sociais e teve êxito. Os argentinos cancelaram a partida.

A disseminação da internet também envolve questões como direitos autorais, privacidade, responsabilidade civil, fake news, censura e punições para crimes virtuais, temas que estão sendo discutidos em muitos países atualmente. 


Conceito de fake news - Instrumento muito utilizado na internet e na redes socias com o objetivo de desinformar, manipular e expandir o discurso de ódio por extremistas radicais.

Ato no Dia Internacional da Mulher realizado em São Paulo (SP), 2020. As redes sociais se tornaram um meio de divulgação de movimentos e de organização de protestos.

A ocidentalização da cultura mundial

O cinema, a televisão e a internet têm promovido a “ocidentalização” da cultura mundial, segundo alguns críticos. Eles defendem que o que se observa na globalização é muito mais uma imposição de valores ocidentais do que um intercâmbio entre culturas. Exemplos disso seriam a hegemonia da língua inglesa, dos filmes de Hollywood e das marcas europeias e estadunidenses. Outros autores, porém, relativizam esse processo lembrando que há significativas trocas culturais entre países ricos e pobres, entre o Ocidente e o Oriente. Alguns exemplos dessa troca são o sucesso das culinárias chinesa, indiana e mexicana na Europa e nos Estados Unidos e a popularização das artes marciais japonesas, chinesas e coreanas, como o judô, o kung fu e o tae kwon do.

A ascensão do neoliberalismo

A globalização não teria alcançado a dimensão de hoje sem a existência de governos empenhados na tarefa de remover as barreiras, nacionais e internacionais, à iniciativa privada e à livre circulação de capitais. Isso significava uma mudança profunda em relação ao Estado de bem-estar social, que caracterizou o governo de várias nações após a Segunda Guerra Mundial, principalmente na Europa. Os países que adotaram essa política após o conflito assumiram a responsabilidade de garantir aos cidadãos educação, saúde, emprego, benefícios trabalhistas e outros direitos sociais.


Governos burgueses empenhados na tarefa de remover as barreiras, nacionais e internacionais, à iniciativa privada e à livre circulação de capitais.

A crise econômica dos anos 1970, no entanto, enfra­queceu o Estado de bem-estar social, que passou a ser atacado como um dos causadores da crise. Opondo-se a ele, entrou em cena o neoliberalismo, teoria econômica que retomou e atualizou as ideias liberais do século XVIII.


Conceito de neoliberalismo

Os neoliberais pregam a redução do Estado à ­tarefa mínima de garantir as leis comuns e a economia de ­mercado. Segundo eles, a economia cresce quando os governos eliminam todas os obstáculos aos investimentos e à livre circulação de capitais e mercadorias. Entre esses obstáculos, estão a taxação do lucro das empresas, os encargos trabalhistas, como recolhimento obrigatório do fundo de garantia e da previdência social, a cobrança de tarifas alfandegárias sobre produtos importados, o monopólio estatal sobre serviços de energia, água e telefonia, além de leis que limitam o desmatamento e a exploração mineral. Os neoliberais defendem ainda a redução dos gastos do Estado com saúde e educação e a criação de estímulos para que a iniciativa privada atue nesses setores.


A política neoliberal flexibilizou as leis trabalhistas, retirando direitos dos trabalhadores (salário mínimo, carteira assinada, fundo de garantia, previdência social) e possibilitando aumento dos lucros dos empresários. O período de apogeu do neoliberalismo ficou marcado pelo aumento da desigualdade social e aumento da concentração de renda nas mãos dos mais ricos.


Governo Temer e o Bolsonaro diminuíram intensamente os investimentos em saúde e em educação pública.

Os governos que se transformaram em símbolos das teorias econômicas neoliberais foram o de ­Margaret Thatcher, primeira-ministra do Reino Unido de 1979 a 1990, e o de Ronald Reagan, presidente dos Estados Unidos de 1980 a 1988. Durante esses governos, empresas públicas de energia, mineração, telefonia e abasteci­mento de água foram privatizadas; removeram-se as barreiras legais à expansão do ­sistema financeiro e dos setores de comunicações e transportes; e os impostos sobre os lucros do grande capital foram suprimidos ou reduzidos.

Ao mesmo tempo, os dois governos promoveram cortes nos gastos com saúde, educação, moradia popu­lar e benefícios aos aposentados e desempregados. A legislação trabalhista foi alterada para substituir a ação dos sindicatos pela livre negociação entre trabalhadores e patrões. 


"Livre negociação entre trabalhadores e patrões." 


Precarização do trabalho - Trabalho informal em ascensão. 

Na década de 1990, a recuperação econômica dos Estados Unidos e do Reino Unido, somada ao fim do socia­lismo nos países do Leste Europeu, contribuiu para difundir as teorias neoliberais por outros países. 

Manifestação de mineiros em Celynen North, no Reino Unido, 1984. A decisão de Margaret Thatcher de fechar as minas de carvão de Whitewell, na Inglaterra, desencadeou uma greve de mineiros no país que durou dezesseis meses.

Políticas neoliberais na América Latina


A influencia da política de estado mínimo dos EUA sobre os governos da América Latina. 

No contexto da globalização, o neoliberalismo também se expandiu pelo restante do mundo, sendo ­adotado por muitos países latino-americanos. A via neoliberal foi vista por muitos governos como uma saída para o subdesenvolvimento e a pobreza na região. As medidas adotadas variaram de país para país ao longo dos anos 1980 e 1990, principalmente.

O Chile foi o primeiro país da região a adotar práticas neoliberais, ainda no governo ditatorial de Augusto Pinochet, a partir de 1973. Em seu governo, o Chile promoveu a privatização de companhias estatais, a entrada de capitais estrangeiros, a abertura às importações, a diminuição drástica dos gastos com o Estado, a substituição do ensino público pelos créditos estudantis, a privatização do sistema de seguridade social e a redução dos benefícios sociais.

No entanto, essas mudanças na economia agravaram a desigualdade social no Chile, aprofundando a má distribuição de renda, diminuindo o poder aquisitivo dos trabalhadores e piorando a situação de pobreza da maior parte da população. Com isso, algumas dessas ações foram revertidas ao longo dos anos 1980.

Na Argentina, sob o governo de Carlos Menem, entre 1989 e 1999, adotou-se um programa de desregulamentação da economia, que incluiu ações como a privatização de estatais e a concessão de serviços públicos. Setores estratégicos importantes, como transporte, eletricidade, telecomunicações e siderurgia, passaram a ser controlados por grupos transnacionais. Além disso, as relações de trabalho foram flexibilizadas, o que gerou forte reação dos sindicatos.

Algumas medidas trouxeram certa estabilidade econômica: de 1991 para 1992, a inflação caiu de 171,7% para 24,9%. Contudo, a longo prazo, elas elevaram os juros interno e externo, o índice de desemprego, diminuição da renda do trabalhador, o ­déficit público e a dívida externa. Não houve um ­aumento ­expressivo das taxas de consumo e de investimento nem um crescimento econômico com distribuição de renda. Ao contrário, o salário mínimo real se retraiu e o mercado de trabalho se precarizou. A economia argentina ficou vulnerável e dependente do capital externo. Esses e outros fatores levaram à crise argentina de 2001.

Nos anos 1990, Brasil (veja aqui no Blog os governos Collor, Itamar e Fernando Henrique Cardoso), Equador, Paraguai, Uruguai, Peru, Bolívia, Venezuela, Colômbia e México, entre outros países latino-americanos, também adotaram as práticas neoliberais. No final do século XX, contudo, as crises econômicas e o aumento do desemprego, a exemplo da Argentina, levaram alguns governos na América Latina a abandonar parte dos princípios neoliberais.


Carlos Menem e sua esposa, Zulema Yoma, acenam para a multidão em frente à Casa Rosada, em Buenos Aires, em julho de 1989, após a cerimônia de posse da presidência da república.

O Mercosul

Em 1991, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai assinaram o Tratado de Assunção, que criou o Mercado Comum do Sul (Mercosul). Assumindo aspectos da agenda neoliberal, esse bloco econômico foi criado com o objetivo principal de estabelecer uma união aduaneira ou mercado comum entre os países-membros com a livre circulação interna de bens e serviços, de modo a atingir o desenvolvimento econômico da região e inserir competitivamente os países-membros no mercado internacional. O Mercosul, atualmente, também visa criar políticas públicas regionais para combater a desigualdade social e garantir a democracia, os direitos humanos e a estabilidade política na América do Sul. 

Mercosul

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