A Era Vargas: O Brasil entre a Revolução, o Autoritarismo e os Direitos Trabalhistas
O que foi a Era Vargas?
A Era Vargas foi um dos períodos mais decisivos e transformadores da história do Brasil,compreendendo os anos de 1930 a 1945 e, posteriormente, de 1951 a 1954. Caracterizou-se por uma forte centralização do poder nas mãos do Estado, pela modernização da economia e do aparato estatal, e pela criação de uma legislação trabalhista que moldaria as relações de trabalho no país por décadas. Foi uma época de profundas contradições, mesclando avanços sociais com autoritarismo político.
Quem foi Getúlio Vargas?
Getúlio Dornelles Vargas(1882-1954) foi um político gaúcho que se tornou a figura central da política nacional por quase vinte anos. Advogado e grande estancieiro, sua carreira política iniciou-se na Assembleia Legislativa e depois no Ministério da Fazenda. Era conhecido por seu estilo calculista, pragmático e por sua habilidade em negociações, o que lhe rendeu a alcunha de "O Chefe". Sua imagem foi construída em torno de duas facetas: a do "Pai dos Pobres", benfeitor das massas trabalhadoras, e a do ditador autoritário do Estado Novo.
Contexto Histórico e a Chegada ao Poder
Vargas chegou ao poder em 1930,no contexto da crise do sistema oligárquico da República Velha, dominado pela "política do café com leite" (alternância de poder entre São Paulo e Minas Gerais). A economia agroexportadora, dependente do café, foi severamente abalada pela Crise de 1929, que derrubou os preços das commodities no mercado internacional.
A insatisfação com o domínio das oligarquias era crescente, alimentada por setores da classe média urbana, tenentes militares reformistas e pela burguesia industrial emergente. A gota d'água foi a ruptura do pacto do café com leite, quando o presidente Washington Luís (paulista) indicou outro paulista, Júlio Prestes, para sucedê-lo, ignorando o candidato mineiro.
Derrotado nas eleições, Getúlio Vargas tornou-se o líder da Revolução de 1930, um movimento armado que depôs o presidente Washington Luís e impediu a posse de Júlio Prestes. Vargas assumiu a chefia do "Governo Provisório", marcando o fim da República Velha.
Divisão Histórica da Era Vargas (1930-1945)
A Era Vargas pode ser dividida em três fases principais:
1. Governo Provisório (1930-1934): Período de centralização do poder, dissolução do Congresso e nomeação de interventores nos estados.
2. Governo Constitucional (1934-1937): Vargas é eleito presidente indiretamente pela Assembleia Constituinte de 1934, que promulgou uma nova Constituição. Foi um período de intensa agitação política, com a ascensão de grupos fascistas (Ação Integralista Brasileira - AIB) e movimentos de esquerda (Aliança Nacional Libertadora - ANL).
3. Estado Novo (1937-1945): Período ditatorial, iniciado com um golpe de Estado liderado pelo próprio Vargas, que fechou o Congresso Nacional e outorgou uma nova Constituição autoritária.
Características Gerais da Era Vargas
As principais características do período foram:
· Fortalecimento do Estado: O Estado assumiu o papel de principal agente da economia e do controle social.
· Nacionalismo Econômico: Defesa dos recursos nacionais e criação de empresas estatais.
· Industrialização por Substituição de Importações: Incentivo à produção interna para reduzir a dependência externa.
· Populismo: Estabelecimento de um vínculo direto entre o líder e as massas, bypassando as instituições tradicionais.
· Autoritarismo e Centralização: Supressão das liberdades democráticas, especialmente durante o Estado Novo.
· Culto à Personalidade: Construção da imagem de Vargas como um líder paternalista e indispensável.
Economia, Política, Sociedade e Cultura
· Economia: O Estado promoveu a industrialização, criando bases para setores como siderurgia (Companhia Siderúrgica Nacional - CSN) e mineração (Companhia Vale do Rio Doce). O intervencionismo estatal era a regra, com órgãos como o Conselho Federal de Comércio Exterior (CFCE) controlando as atividades econômicas.
· Política: A política foi marcada pela supressão dos partidos políticos e pela centralização do poder no Executivo. O pluripartidarismo foi extinto, e o poder legislativo foi fechado ou severamente controlado.
· Sociedade: Houve uma significativa transição de uma sociedade rural para uma sociedade urbana. A criação das leis trabalhistas integrou o operariado ao sistema, cooptando seus anseios e evitando movimentos revolucionários.
· Cultura: O Estado promoveu uma cultura nacionalista e ufanista, com o samba, o futebol e as rádios sendo utilizados como instrumentos de propaganda e unificação nacional. O Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) foi o principal órgão de censura e difusão da ideologia varguista.
O Trabalhismo e a Imagem de "Pai dos Pobres"
Vargas construiu cuidadosamente a imagem de"Pai dos Pobres", um líder benevolente que concedia direitos aos trabalhadores. O trabalhismo foi a base dessa relação. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943, sintetizou uma série de direitos, como:
· Carteira de Trabalho
· Jornada de 8 horas
· Descanso semanal remunerado
· Férias
· Salário Mínimo
· Previdência Social (criação dos Institutos de Aposentadoria e Pensões)
Essas conquistas, embora muitas vezes fossem uma forma de controle estatal sobre os sindicatos (através do peleguismo), garantiram a Vargas um apoio massivo das classes populares.
A Festa do Trabalho e o Estádio de São Januário
Em 1º de maio de 1940,Vargas anunciou o Salário Mínimo em um grande comício no Estádio de São Januário, do Vasco da Gama, no Rio de Janeiro. Esse evento simbolizou a apropriação pelo Estado do Dia do Trabalho, que deixou de ser uma data de protesto operário para se tornar uma festa cívica, onde o governo anunciava novas benesses trabalhistas, reforçando o mito do "pai dos pobres".
Principais Opositores e a Revolução Constitucionalista de 1932
Os opositores de Vargas eram diversos:
· Oligarquias Tradicionais: Especialmente as paulistas, que perderam poder com a Revolução de 1930. Esse descontentamento levou à Revolução Constitucionalista de 1932, um movimento armado em São Paulo que exigia uma constituição e o fim do governo provisório. Embora derrotado militarmente, o movimento pressionou Vargas a convocar a Assembleia Constituinte de 1934.
· Integralistas (AIB): De inspiração fascista, foram aliados de Vargas no início, mas foram suprimidos por ele após o golpe do Estado Novo.
· Comunistas (PCB) e Liberais: Eram perseguidos sistematicamente pelo regime, vistos como ameaças à ordem.
O Plano Cohen e o Golpe do Estado Novo
Em 1937,às vésperas das eleições presidenciais, o governo divulgou um suposto plano comunista para tomar o poder, o Plano Cohen (posteriormente revelado como uma farsa forjada por integralistas com conivência do governo). Usando esse "perigo vermelho" como justificativa, Vargas deu um golpe de Estado, fechou o Congresso e outorgou a Constituição de 1937, de caráter claramente autoritário e inspirada no fascismo, inaugurando o Estado Novo.
Autoritarismo, Censura e Perseguição
O Estado Novo foi um regime ditatorial.Suas principais características foram:
· Censura Prévia: O DIP controlava todos os meios de comunicação.
· Perseguição Política: Opositores eram presos, torturados e exilados. A polícia política de Vargas, chefiada por Filinto Müller, era notória por sua brutalidade.
· Supressão de Direitos: A Constituição de 1937 conferia poderes quase absolutos ao presidente e suspendia as eleições diretas.
Vargas e o Fascismo
Embora o Estado Novo tivesse elementos similares ao fascismo(nacionalismo, autoritarismo, culto ao líder, controle da mídia), ele não era uma réplica exata. Vargas era, acima de tudo, um pragmático. Ele se aproveitou da simbologia e dos métodos fascistas para se manter no poder, mas sua base de sustentação era mais diversificada, incluindo os militares e as massas trabalhadoras.
Brasil na Segunda Guerra Mundial
Aqui reside uma grande contradição:enquanto mantinha um regime autoritário em casa, o Brasil se aliou aos Aliados (Estados Unidos e Reino Unido) na luta contra o Eixo (Alemanha, Itália e Japão) na Segunda Guerra. A participação da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Itália, somada à pressão interna, criou um ambiente insustentável: era difícil combater o fascismo na Europa enquanto se mantinha uma ditadura no Brasil. O "senta a pua" da FEB contrastava com o "senta a pua" que os opositores de Vargas sofriam no país.
Fim da Era Vargas (1945)
A contradição da guerra acelerou o fim do Estado Novo.A pressão por redemocratização tornou-se irresistível. Em 1945, Vargas foi forçado a marcar eleições para presidente. Temendo que Vargas tentasse se perpetuar no poder através de um novo golpe ("queremismo"), os militares, liderados pelos generais Góes Monteiro e Eurico Dutra, depuseram Vargas em 29 de outubro de 1945, encerrando assim seu primeiro período no poder.
Legado
A Era Vargas deixou um legado ambíguo e duradouro.Por um lado, modernizou o país, criou as bases da indústria nacional e instituiu direitos sociais fundamentais. Por outro, consolidou uma tradição de autoritarismo, centralização e intervencionismo estatal. Getúlio Vargas, uma figura complexa e controversa, continua sendo um dos personagens mais fundamentais para se compreender o Brasil do século XX.
ATIVIDADE PONTUADA (1,5)
Claro! Aqui está um exercício com 16 questões baseado no texto sobre a Era Vargas, seguindo a estrutura solicitada.
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Exercício: A Era Vargas
Instruções:
· Questões 01 a 08: Responda de forma discursiva, utilizando as informações do texto.
· Questões 09 a 16: Marque a alternativa correta.
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Parte 1: Questões Discursivas
01. O que foi a Era Vargas e quais são suas principais características gerais?
02.Quem foi Getúlio Vargas e quais as duas facetas de sua imagem pública?
03.Explique o contexto histórico que permitiu a chegada de Getúlio Vargas ao poder em 1930.
04.Quais são as três fases em que se divide a Era Vargas no período de 1930 a 1945?
05.O que foi o trabalhismo e como ele contribuiu para a construção da imagem de Vargas como "Pai dos Pobres"?
06.Qual o significado histórico do evento realizado no Estádio de São Januário no dia 1º de maio de 1940?
07.Quem foram os principais grupos de oposição a Vargas e por quais motivos se opunham a ele?
08.O que foi o Plano Cohen e qual a sua relação com a implantação do Estado Novo?
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Parte 2: Questões de Múltipla Escolha
09. A Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder, foi motivada principalmente:
a)Pela vitória eleitoral de Vargas e sua posse imediata na presidência.
b)Pela crise do sistema oligárquico, agravada pela Crise de 1929, e pela ruptura do pacto do café com leite.
c)Pelo apoio integral das oligarquias paulistas ao candidato derrotado.
d)Pelo sucesso do modelo agroexportador, que exigia um governo centralizador.
10. A Constituição promulgada durante o Governo Constitucional de Vargas (1934-1937) tinha como uma de suas principais características:
a)A outorga pelo presidente, sem a participação de uma assembleia constituinte.
b)O estabelecimento de um estado de exceção permanente e a supressão de todos os direitos individuais.
c)A eleição indireta de Vargas para presidente pela Assembleia Constituinte.
d)A inspiração explícita no modelo fascista italiano.
11. A política econômica da Era Vargas foi marcada pelo(a):
a)Liberalismo econômico e desregulamentação total do mercado.
b)Fortalecimento do setor agroexportador como única prioridade nacional.
c)Nacionalismo econômico, intervencionismo estatal e industrialização por substituição de importações.
d)Abertura completa do mercado para empresas multinacionais.
12. O Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), durante o Estado Novo, tinha como função principal:
a)Defender a liberdade de imprensa e a pluralidade de opiniões.
b)Promover a cultura nacionalista e exercer a censura aos meios de comunicação.
c)Organizar sindicatos livres e independentes do controle estatal.
d)Gerenciar exclusivamente as campanhas publicitárias das estatais.
13. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943, sintetizou uma série de direitos. Assinale a alternativa que NÃO representa um direito garantido pela CLT no período:
a)Jornada de trabalho de 8 horas.
b)Seguro-desemprego.
c)Salário Mínimo.
d)Férias remuneradas.
14. A Revolução Constitucionalista de 1932, ocorrida em São Paulo, teve como principal motivação:
a)Apoiar a continuidade do Governo Provisório de Vargas indefinidamente.
b)Exigir a promulgação de uma constituição e o fim do governo provisório.
c)Implementar um regime de inspiração comunista no Brasil.
d)Separar o estado de São Paulo do restante do país.
15. Uma das grandes contradições do governo Vargas durante o Estado Novo foi:
a)Combater o fascismo na Segunda Guerra Mundial enquanto mantinha um regime autoritário no Brasil.
b)Apoiar economicamente os países do Eixo enquanto declarava guerra a eles.
c)Promover eleições diretas para presidente enquanto fechava o Congresso.
d)Defender o liberalismo econômico enquanto criava diversas empresas estatais.
16. O fim do Estado Novo e a deposição de Vargas em 1945 foram resultado, principalmente:
a)De uma nova revolução liderada pelas oligarquias paulistas.
b)Da vitória do Brasil na Segunda Guerra e da pressão por redemocratização.
c)De um impeachment realizado pelo Congresso Nacional.
d)Da renúncia voluntária de Vargas para se candidatar novamente.
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