segunda-feira, 18 de dezembro de 2023

Desdobramentos culturais, econômicos e ambientais da industrialização

Desdobramentos culturais, econômicos e ambientais da industrialização


A multidão das cidades

O avanço da industrialização alterou significativamente o cotidiano das pessoas. Nas ruas, assistia-se ao surgimento de um novo fenômeno: a multidão. A impessoalidade passou a caracterizar as relações entre os moradores. Diferentemente da vida no campo ou em pequenos agrupamentos urbanos, as pessoas que se cruzavam nas ruas não se conheciam.


Em meio à multidão, eram inevitáveis os empurrões e os encontrões, a mistura de ruídos e odores, as rápidas trocas de olhares. O olfato passava a conviver com o cheiro do lixo que se acumulava nas ruas. Os ruídos das máquinas e dos transeuntes tornavam o silêncio quase impossível. As pessoas em movimento eram um espetáculo novo para o olhar.


A criminalidade crescia com a dificuldade de controlar as multidões. 

Na cidade de Londres, que ultrapassou 1 milhão de habitantes no final do século XVIII, os relatos de crimes escandalizavam e atemorizavam os moradores.


Em 1829, foi criada a Scotland Yard, nome pelo qual ficou conhecida a Polícia Metropolitana de Londres. 

A princípio formada por policiais à paisana que vigiavam as ruas e prendiam criminosos em flagrante, em 1878 uma divisão especial de investigação passou a atuar na solução de grandes roubos e assassinatos.


O antagonismo entre policiais e criminosos estimulou a imaginação de escritores. Em 1887, Arthur Conan Doyle lançou Sherlock Holmes, narrativa policial em que a competência da Scotland Yard era colocada em xeque pelo famoso personagem, capaz de resolver crimes que ficaram insolúveis na vida real.


Também ganharam destaque os romances policiais de Agatha Christie (1890-1976). No livro O misterioso caso de Styles, de 1920, aparece pela primeira vez o aclamado personagem Hercule Poirot, detetive belga que se tornaria protagonista de uma série de outros livros.



Cena da primeira temporada da série Sherlock, de 2010, inspirada na obra do escritor escocês Arthur Conan Doyle. Grande sucesso de público e crítica, a série recebeu dezenas de prêmios e obteve audiência recorde.


A literatura das multidões

Vários autores procuraram compreender as cidades em suas narrativas. Era por meio do texto, também, que escritores e leitores aprendiam a lidar com o fascínio e o medo que as metrópoles provocavam. 


O inglês Charles Dickens (1812-1870), por exemplo, elegeu a vida nas cidades inglesas como o tema preferencial da sua literatura. Parte importante de suas obras trata de ambientes de trabalho degradados, das más condições de vida dos operários e de relações humanas desgastadas em decorrência das dificuldades cotidianas. 


O poeta francês Charles Baudelaire (1821-1867) foi um observador sagaz das metrópoles e captou com precisão a melancolia, os temores e as angústias de seus moradores. Entre suas principais obras estão As flores do mal, de 1857, e Paraísos artificiais, de 1860. 


No conto O homem da multidão, de 1842, o escritor estadunidense

Edgar Allan Poe (1809-1849) constatou a solidão do cidadão urbano, apesar de viver cercado de gente. 


“Há não muito tempo, ao fim de uma tarde de outono, eu estava sentado ante a grande janela do Café D... em Londres [...]. 


Muitos dos passantes tinham um aspecto prazerosamente comercial e pareciam pensar apenas em abrir caminho através da turba. Traziam as sobrancelhas vincadas, e seus olhos moviam-se rapidamente; quando davam algum encontrão em outro passante,

não mostravam sinais de impaciência; recompunham-se e continuavam, apressados, seu caminho. Outros, formando numerosa classe, eram irrequietos nos movimentos; tinham o rosto enrubescido e resmungavam e gesticulavam consigo mesmos, como se se sentissem solitários em razão da própria densidade da multidão que os rodeava.” 


POE, Edgar Allan. O homem da multidão. In: Contos.

São Paulo: Cultrix, 1986. p. 133.



“Trote! Meu querido, Trote!“, gritou minha tia, em um sussurro aterrorizado e apertando meu braço. “Eu não sei o que devo fazer”. Ilustração e trecho da obra David Copperfield, de Charles Dickens, 1871-1880.


Os impactos ambientais da industrialização

Muitas mudanças que ocorreram com a Revolução Industrial baseavam-se na crença de que os recursos naturais eram infinitos e estavam a serviço do ser humano. Não havia a consciência de que o consumo desenfreado de matérias-primas e o uso de combustíveis fósseis pudessem causar danos ambientais, em muitos casos irreversíveis, e alterações climáticas que afetariam a vida humana.


A atividade industrial de larga escala impulsionou o crescimento urbano e acarretou grandes impactos ambientais na Inglaterra. A instalação de fábricas levou à poluição das águas e do ar e à alteração do hábitat de muitas espécies.


Um exemplo dessa mudança é o das mariposas Biston betularia da cidade de Manchester. A maioria dessas mariposas tinha coloração branca, o que possibilitava sua camuflagem nos troncos das árvores. Com o surgimento das fábricas e o aumento da poluição do ar, os troncos das árvores tornaram-se escuros. As mariposas brancas, assim, praticamente deixaram de existir, pois, como não podiam mais se camuflar nas árvores, eram facilmente identificadas pelos predadores. Já as mariposas escuras, mais adaptadas ao novo ambiente, puderam sobreviver.


Além disso, a construção de ferrovias e de novas fábricas acarretou o desmatamento de grandes áreas de vegetação. A população dos grandes centros industriais cresceu desordenadamente, causando acúmulo de lixo e dejetos.


Atualmente, o modelo de produção implantado com a Revolução Industrial sofre inúmeras críticas. Campanhas de estímulo ao consumo consciente dos recursos naturais e ao reúso e à reciclagem de materiais procuram diminuir o uso de matérias-primas no dia a dia. Dessa forma, procura-se garantir a qualidade de vida das populações atuais e o usufruto desses recursos pelas gerações futuras.



Acima, gravura representando a cidade de Stockport, Inglaterra, c. 1845. Note a poluição da água e do ar provocada pelas fábricas. Ao lado, mariposas da espécie Biston betularia. 


A supremacia britânica no comércio mundial

As inovações tecnológicas inicialmente aplicadas ao setor têxtil se estenderam para a mineração, a metalurgia, os transportes e a agricultura. A burguesia inglesa ampliou sua participação no mercado mundial, impulsionada pelo forte apoio do governo nacional.


Na África e na Ásia, os governos acabaram cedendo às pressões diplomáticas da Inglaterra e abriram seus mercados aos produtos britânicos. Os novos países independentes da América Latina, procurando afastar a influência das antigas metrópoles, aproximaram-se dos ingleses, contraindo dívidas e assinando acordos políticos e comerciais com a Inglaterra.


A partir da Revolução Industrial, a Inglaterra passou a dificultar a entrada de tecidos, especiarias e outros produtos indianos no mercado britânico, ao mesmo tempo que inundava a Índia com os produtos ingleses. A produção artesanal indiana de tecidos foi levada à ruína.


O crescimento da economia industrial inglesa foi impulsionado também pela expansão das ferrovias. A primeira linha férrea comercial foi inaugurada na Inglaterra em 1830. Na França, na Prússia e na Bélgica, para onde a industrialização se estendeu, as ferrovias entraram em funcionamento ao longo daquela década. Vencendo distâncias, abrindo países ao mercado mundial e integrando povos e culturas, elas exibiam o poder e a velocidade que marcavam a nova era.


A prosperidade britânica e a expansão da industrialização para outros países em meados do século XIX fortaleceram os defensores do liberalismo econômico. A Inglaterra tornou-se modelo para os economistas que combatiam a política mercantilista do Antigo Regime, com suas medidas para regulamentar a economia



Ilustração de 1861 que representa um comerciante inglês sendo servido por um garçom chinês e um chef tailandês em um restaurante em Yokohama, no Japão.


Uma revolução nos transportes

Desde o século XVI, o transporte sobre trilhos era utilizado na mineração para levar o carvão e o ferro das profundezas das minas até a superfície. Os trilhos eram feitos de madeira e sobre ele deslizavam vagonetes, empurrados por trabalhadores braçais ou puxados por cavalos.


No início do século XIX, o inventor inglês Richard Trevithick aproveitou a energia da máquina a vapor de James Watt para desenvolver um veículo que deslizava sobre trilhos de ferro: a locomotiva a vapor. Os trilhos foram levados para fora das minas e passaram a transportar carvão e ferro até os portos, de onde seguiam, em navios, para outros países.


Logo outros inventores aperfeiçoaram a locomotiva a vapor. A primeira estrada de ferro, inaugurada em 1830, ligava duas cidades inglesas: Liverpool e Manchester. Seu sucesso incentivou outros empresários a investir nas ferrovias, que se multiplicaram pela Europa durante o século XIX.



Fonte: VICENTINO, Cláudio. Atlas histórico: geral e Brasil. São Paulo: Scipione, 2011. p. 122.


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