Nordeste açucareiro - Economia e sociedade do açúcar.
Economia açucareira
Durante os dois primeiros séculos de colonização, o açúcar se tornou o produto mais lucrativo e o principal negócio para a Coroa e para os comerciantes portugueses. Os melhores resultados foram alcançados na faixa litorânea do Nordeste, especialmente em Pernambuco e na Bahia. As duas capitanias foram favorecidas pela maior proximidade da metrópole, pela disponibilidade de terras aráveis e pela existência de rios navegáveis, que facilitavam o transporte do açúcar.
A produção açucareira ocorria nos engenhos. O engenho colonial era composto pela lavoura canavieira, pelas instalações onde a cana era transformada em açúcar, pelas moradias de proprietários e trabalhadores e, muitas vezes, por uma capela, onde se realizavam missas, casamentos e festividades previstas no calendário da Igreja.
No entanto, poucos fazendeiros contavam com recursos próprios para montar uma plantação de cana e arcar com os custos de instalação dos equipamentos utilizados para a fabricação do açúcar. Por isso, a atividade açucareira esteve, desde o início, associada a financistas europeus, principalmente flamengos e holandeses. Eles emprestavam dinheiro para a aquisição e manutenção de maquinário, a compra de escravos e o aumento da área de cultivo. Além disso, eles se encarregavam do refino do açúcar que os portugueses levavam para a Europa.
A produção de açúcar (séculos XVI-XVII) - os dois primeiros séculos da colonização portuguesa na América foi o período de apogeu da economia açucareira na região.
A produção de açúcar no Brasil no século XVII
O açúcar produzido no Brasil fazia parte de uma extensa rede de comércio internacional. Além de gerar lucros aos comerciantes e financistas europeus e de aumentar a arrecadação da Coroa portuguesa, o comércio do açúcar ajudou a impulsionar o tráfico de escravos africanos e a animar a economia de muitas cidades europeias.
Dos engenhos para o mundo
Os engenhos ficavam a meio caminho entre o oceano, conexão obrigatória com a Europa, e os canaviais e as florestas.
Exportações de açúcar do Brasil
O comércio do açúcar se desenvolveu rapidamente. Já no começo do século XVII, através de Lisboa, cerca de 50 mil caixas de açúcar do Brasil chegavam por ano à Holanda. Depois de refinado, o produto era distribuído pela Europa.
As guerras entre Holanda e Espanha durante a União Ibérica e a concorrência do açúcar das Antilhas prejudicaram as vendas do açúcar brasileiro no exterior.
Como era feito o açúcar no Brasil colonial
Até o século XVIII, a produção de açúcar foi uma das atividades mais complexas realizadas na colônia. Os engenhos eram um agrupamento de fábrica, canaviais e matas virgens, onde alguns poucos senhores e trabalhadores livres fiscalizavam o trabalho de grande número de escravizados.
Figura engenho 01
Figura engenho 02 - Seu funcionamento (clique na figura para melhor visualização)
Distribuição da mão de obra em um engenho
Na maior parte dos engenhos, a mão de obra era composta de cerca de 40 escravos e alguns poucos trabalhadores livres; alguns engenhos, no entanto, chegaram a ter mais de 350 escravos. Veja abaixo como era distribuída a mão de obra em um engenho de grande porte no Nordeste do começo do século XVII.
Mão de obra no engenhos de açucar
Em relação ao trabalho dos escravizados nos engenhos, além de trabalharem longas jornadas, viviam em péssimas condições, vestiam trapos, eram açoitados pelos capatazes e se alimentavam muito mal. Trabalhavam tanto na produção da cana, como nas casas senhoriais, ocupando-se da cozinha, faxina, criação dos filhos do senhor, etc.
A produção açucareira era um dos principais pilares da colonização de exploração na América Portuguesa. Dentro deste contexto do mercantilismo e colonização portuguesa, destacamos o sistema de plantation. O plantation consistia principalmente na produção de produtos tropicais em latifúndios monocultores para o mercado externo, utilizando para isso força de trabalho escrava.
O plantation é um sistema de produção agrícola que foi implantado pelas nações europeias em suas colônias. Os historiadores entendem o plantation como uma prática que fazia parte do mercantilismo. O plantation se baseava no latifúndio, na monocultura, no trabalho escravo e era voltado para atender o mercado exterior.
A sociedade do engenho
O engenho colonial, além de ser o coração da produção açucareira, era espaço de convívio social e trocas culturais, de escravidão e resistência. Reunindo senhores, escravos, lavradores de cana, sacerdotes e diferentes tipos de trabalhadores livres, o engenho deu forma, em grande parte, à sociedade colonial. E o Brasil de hoje, em muitos aspectos, é herdeiro dessa sociedade que se formou em torno da produção de açúcar.
Conheça agora os principais grupos sociais do engenho e suas tarefas na economia açucareira.
Os senhores de engenho
Os proprietários do engenho eram chamados de senhores de engenho. Eram detentores de grandes riquezas, terras e escravos e representavam o poder máximo no engenho. Em seu dia a dia, ocupavam-se com a administração da propriedade, com o comércio de açúcar e de escravos e com o pagamento dos trabalhadores livres.
Os senhores de engenho moravam na casa-grande, que era o centro administrativo e religioso da propriedade. As primeiras construções, com paredes de barro e teto de sapé ou folhas de palmeira, tornaram-se depois mais sólidas, com alicerces de pedra e telhados de barro.
As casas podiam ser térreas, embora as assobradadas (com mais de um andar) fossem mais apreciadas. Essas residências contavam com muitos cômodos. Até o século XVIII, embora fossem espaçosas, raramente eram luxuosas; em geral tinham poucos móveis e objetos decorativos.
É equivocado imaginar que os senhores de engenho mantinham pouco ou nenhum contato com o mundo urbano. Muitos engenhos da Bahia e de Pernambuco, por exemplo, ficavam próximos às cidades portuárias, como Salvador e Olinda, onde vários senhores de engenho tinham residência, negócios e atividades sociais.
Capela e casa-grande no Engenho Poço Comprido, em Vicência (PE). Foto de 2017. Único engenho remanescente do século XVIII em Pernambuco, foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Os africanos escravizados
As dificuldades na escravização de indígenas e a demanda crescente por trabalhadores levaram os senhores de engenho a investir na aquisição de escravizados de origem africana. Isso não significa que o trabalho indígena tenha desaparecido completamente. No entanto, a maior parte das atividades nos engenhos era realizada por africanos escravizados.
Além de participar da produção de açúcar, os escravizados de origem africana trabalhavam como marceneiros, barqueiros, ferreiros e pedreiros. As escravas trabalhavam no eito e em diversas atividades domésticas realizadas na casa-grande.
Os africanos escravizados habitavam a senzala, que podia ser construída pelo senhor ou pelos próprios cativos. As construções erguidas pelo senhor eram geralmente grandes pavilhões térreos, retangulares, divididos em cubículos destinados a casais ou a indivíduos solteiros. Já as moradias construídas pelos escravizados eram bastante precárias e destinadas a abrigar uma família.
Uma vez por ano, os escravizados recebiam duas camisas e saias ou calças, motivo pelo qual andavam muitas vezes em farrapos. Era frequente haver nas fazendas teares domésticos para a fabricação desses tecidos, tarefa geralmente executada por escravas.
A vida dos escravizados de origem africana caracterizou-se, sobretudo, pela violência. A retirada forçada da terra natal, a longa viagem nos navios negreiros, os trabalhos pesados e insalubres nas lavouras, minas e instalações do engenho, a alimentação precária, os castigos físicos e a desagregação das famílias foram traços marcantes da escravidão africana no Brasil.
Ilustração representando a moagem de cana-de-açúcar em um engenho.
Os lavradores de cana
Nem todo produtor tinha recursos para a instalação de um engenho. Os produtores de cana que não possuíam engenho eram chamados lavradores de cana. Eles se dividiam basicamente em duas categorias: os lavradores proprietários e os arrendatários.
Os lavradores proprietários cultivavam a cana em suas próprias terras e a moíam em determinado engenho, de acordo com as condições acertadas com o dono do engenho. Os arrendatários plantavam cana nas terras de um proprietário, sendo obrigados a moer a cana no engenho desse mesmo proprietário e a entregar a ele metade ou a terça parte do açúcar produzido.
O grupo social dos lavradores de cana teve muita importância na sociedade açucareira, tanto que, no século XVII, havia em média cinco lavradores de cana para cada engenho na colônia. Entre os lavradores de cana era possível encontrar desde indivíduos humildes, que possuíam dois ou três escravos e enfrentavam sérias dificuldades, até produtores prósperos, donos de vinte a trinta escravos e ligados, muitas vezes, ao comércio açucareiro e à atividade política.
Engenho de Itamaracá, gravura de Frans Post feita para a obra História dos feitos recentemente praticados durante oito anos no Brasil, de Gaspar Barleus, 1647. Note as instalações do engenho, no centro da imagem, e a casa-grande e a senzala, ao fundo.
O trabalho no engenho na visão de Antonil
O jesuíta italiano André João Antonil (1649-1716) chegou a Salvador, na capitania da Bahia, em 1681, permanecendo na cidade até a sua morte. Grande orador e escritor, assumiu atividades administrativas da Companhia de Jesus na Bahia e publicou, em 1711, um importante testemunho das condições sociais e econômicas na colônia no início do século XVIII. Conheça a seguir um trecho em que ele descreve o trabalho no engenho de açúcar.
“Servem ao senhor do engenho, em vários ofícios, além dos escravos de enxada e foice que tem nas fazendas e na moenda e fora os mulatos e mulatas, negros e negras de casa ou ocupados em outras partes, barqueiros, canoeiros, calafates, carapinas, carreiros, oleiros, vaqueiros, pastores e pescadores. Tem mais cada senhor destes necessariamente um mestre-de-açúcar, um banqueiro e um contrabanqueiro, um purgador, um caixeiro no engenho e outro na cidade, feitores nos partidos e roças, um feitor-mor do engenho, e para o espiritual um sacerdote seu capelão [...]”.
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil. São Paulo: Edusp, 2007. p. 79-80.
Trabalhadores especializados
A produção do açúcar também contava com o trabalho de homens livres que realizavam diversas tarefas especializadas e recebiam um pagamento.
Feitor - uma das funções mais importante do processo produtivo.
A palavra feitor é substantivo masculino que significa gestor; quem administra os bens alheios. Capataz; aquele que supervisionava o trabalho escravo.
* O feitor do eito escolhia as terras para o plantio e o tipo de cana utilizado na lavoura e determinava os momentos adequados para o cultivo e a colheita.
* O feitor da moenda recebia os feixes de cana e controlava a produção do caldo.
* Acima deles estava o feitor-mor, que controlava o trabalho escravo e garantia o bom estado dos equipamentos.
Significado da palavra feitor
Mestre de açúcar. Garantia a qualidade do produto final. Ele definia o momento em que o melaço estava pronto para ser retirado do fogo e levado à purga.
Outros trabalhadores. O purgador administrava o processo de clareamento do açúcar, enquanto o caixeiro retirava a parte dos impostos que cabia à Coroa.
Feitores açoitando negros na roça, detalhe de pintura de Jean-Baptiste Debret, 1828.
Foto - Quadro da aula 2023