Tema da Aula: O Processo de Emancipação Política do Brasil – Para Além do Grito do Ipiranga
Introdução: Um Império em Crise
Olá, turma! Hoje vamos desconstruir uma das narrativas mais tradicionais da nossa história: a Independência do Brasil. Longe de ser um ato isolado e heroico de Dom Pedro I às margens do Ipiranga, a emancipação foi um processo complexo, cheio de interesses conflitantes, pressões internacionais e uma série de eventos que criaram o cenário perfeito para a ruptura com Portugal. Vamos entender como isso aconteceu.
O Estopim: A Revolução Liberal do Porto (1820)
Tudo começa do outro lado do Atlântico. Em 1820, eclode em Portugal a Revolução Liberal do Porto. Seus líderes, burgueses e militares, tinham dois objetivos principais:
1. Restabelecer o Pacto Colonial, que havia sido enfraquecido com a abertura dos portos brasileiros em 1808.
2. Criar uma monarquia constitucional em Portugal, limitando os poderes do rei.
O problema é que, desde 1808, o rei Dom João VI e a corte portuguesa estavam no Rio de Janeiro. O Brasil não era mais uma colônia explorada, mas a sede do Império Português. Para os revolucionários de Porto, isso era inaceitável. A revolução, portanto, tinha um caráter anti-brasileiro: queria recolonizar o Brasil e trazer a família real de volta a Lisboa para submeter o rei ao novo regime constitucional.
A Pressão Portuguesa e a "Crise da Partida"
Sob intensa pressão, Dom João VI não teve escolha senão retornar a Portugal em abril de 1821. Antes de partir, however, ele aconselhou seu filho, Pedro de Alcântara, que ficaria como Príncipe Regente do Brasil: "Pedro, se o Brasil se separar, antes seja para ti, que me hás de respeitar, do que para algum desses aventureiros".
A volta da corte deixou um vácuo de poder. As Cortes Portuguesas (o novo parlamento) começaram a tomar uma série de medidas drásticas:
· Exigiam a volta imediata de Dom Pedro para Portugal, argumentando que ele deveria "completar sua educação política".
· Revogavam os poderes centrais do governo no Rio de Janeiro, subordinando cada província brasileira diretamente a Lisboa.
· Dissolveram os tribunais e exércitos criados no Brasil.
Essas medidas eram claramente um passo towards a recolonização, o que desagradou profundamente às elites brasileiras (agrárias, comerciais e burocráticas), que haviam se beneficiado com a autonomia.
O Dia do Fico: A Resposta do Príncipe
A pressão para que Dom Pedro voltasse era enorme. Em 9 de janeiro de 1822, ele recebeu um abaixo-assinado com milhares de assinaturas de brasileiros, pedindo que ele ficasse. Após deliberar, sua resposta ficou marcada na história:
"Como é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou pronto: diga ao povo que fico."
O Dia do Fico (9 de Janeiro de 1822) foi o primeiro ato de desobediência aberta de Dom Pedro às Cortes. Era a confirmação de que ele estava aliando-se aos interesses das elites brasileiras. Esse ato simbolizou a recusa definitiva do projeto recolonizador.
A Reação Portuguesa e a Aceleração do Processo
As Cortes Portuguesas reagiram com fúria ao "Dico". Classificaram a decisão de Dom Pedro como uma rebeldia e cortaram qualquer diálogo com o governo do Rio de Janeiro. A partir daí, o caminho para a ruptura tornou-se inevitável. Dom Pedro formou um ministério liderado por José Bonifácio de Andrada e Silva, um grande articulador da independência, e começou a governar de forma autônoma, convocando, por exemplo, uma Assembleia Constituinte para o Brasil.
O Grito do Ipiranga: A Declaração Formal
Em agosto de 1822, Dom Pedro viajou para São Paulo para acalmar ânimos políticos. Enquanto estava fora, chegou do Rio uma nova leva de decretos das Cortes, anulando todos os seus atos e exigindo novamente seu retorno, sob ameaça de punição. Sua esposa, a princesa Leopoldina, e José Bonifácio, enviaram as cartas até ele.
Ao recebê-las no dia 7 de setembro de 1822, às margens do rio Ipiranga, Dom Pedro tomou a decisão final. A famosa cena (provavelmente embellished posteriormente) retrata o momento em que, indignado, ele teria declarado: "Independência ou Morte!". Este foi o ato formal de ruptura política. Em 1º de dezembro do mesmo ano, Dom Pedro foi coroado Imperador do Brasil.
A Reação Portuguesa e as Batalhas pela Consolidação
Portugal não aceitou a independência pacificamente. O reconhecimento não foi imediato e foi conquistado na ponta da espada. Tropas portuguesas estavam estacionadas em várias províncias, principalmente no Nordeste, no Pará e na Bahia, que eram fortemente ligadas a Lisboa.
Travou-se uma verdadeira guerra de independência, com batalhas significativas como as do Pirajá (BA) e do 4 de Maio (MA). A consolidação militar deveu-se muito ao talento de mercenários como Lord Cochrane (ingles) e ao esforço de brasileiros, que formaram exércitos e esquadras para expulsar as tropas portuguesas. A luta foi sangrenta e durou mais de um ano em algumas regiões.
O Jogo das Nações: O Reconhecimento Internacional
O reconhecimento internacional foi crucial e movido por interesses econômicos.
· Inglaterra: Foi o primeiro país a reconhecer a independência, em 1825. A Inglaterra tinha enormes interesses comerciais no Brasil e via a independência como uma forma de ampliar seu mercado. No entanto, mediou um acordo pelo qual o Brasil teve que pagar uma indenização de 2 milhões de libras esterlinas a Portugal para ser reconhecido. Além disso, forçou o Brasil a assinar tratados comerciais vantajosos e a se comprometer a abolir o tráfico de escravizados (o que não foi imediatamente cumprido).
· Estados Unidos: Foram o segundo país a reconhecer o Império do Brasil, também em 1825, motivados pela Doutrina Monroe ("América para os Americanos"), que buscava evitar a interferência de potências europeias no continente.
· Outras Nações: Outros países europeus, como a França, só reconheceram a independência após Portugal fazê-lo, seguindo o protocolo diplomático da época.
Conclusão: Uma Independência Conservadora
Portanto, a emancipação política do Brasil foi um processo singular. Não foi uma revolução popular e sim um arranjo político das elites brasileiras, que se aliaram ao herdeiro do trono português para evitar tanto a recolonização por Portugal quanto uma ruptura radical que pudesse ameaçar a ordem social escravista e agrária (como aconteceu no Haiti). O resultado foi uma independência conservadora, que manteve a monarquia, a escravidão e os privilégios de uma pequena parcela da população, mas que, sem dúvida, fundou o Brasil como uma nação soberana.
Para refletir: Que contradições desse processo de independência ainda percebemos na sociedade brasileira hoje?
Claro! Segue abaixo um exercício completo com 20 questões baseadas no texto, seguido do gabarito.
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Exercício: Processo de Emancipação Política do Brasil
Instruções: Leia atentamente o texto fornecido e responda às questões abaixo.
Questões Discursivas:
1. Explique os dois principais objetivos da Revolução Liberal do Porto (1820) e por que ela possuía um caráter "anti-brasileiro".
2. Qual foi o conselho dado por Dom João VI a Dom Pedro antes de retornar a Portugal? Qual o significado político desse conselho?
3. Descreva duas medidas tomadas pelas Cortes Portuguesas após o retorno de Dom João VI que demonstravam a intenção de recolonizar o Brasil.
4. O que foi o "Dia do Fico" e por que ele é considerado um ato de desobediência de Dom Pedro às Cortes?
5. Qual foi a reação das Cortes Portuguesas à decisão de Dom Pedro de permanecer no Brasil ("Dia do Fico")?
6. Além do "Dia do Fico", que outra ação importante Dom Pedro tomou para governar de forma autônoma, indicando o caminho para a independência?
7. O que motivou Dom Pedro a declarar a independência às margens do rio Ipiranga em 7 de setembro de 1822?
8. Por que podemos afirmar que a Independência do Brasil não foi um processo totalmente pacífico? Dê um exemplo.
9. Explique por que a Inglaterra teve um papel crucial no reconhecimento internacional da Independência do Brasil e qual foi uma das principais condições impostas por ela.
10. Por que o texto caracteriza a Independência do Brasil como um processo "conservador"?
Questões de Múltipla Escolha:
1. A Revolução Liberal do Porto (1820) eclode em Portugal com objetivos claros. Entre eles, NÃO se pode citar: a) Restabelecer o Pacto Colonial com o Brasil. b) Reconhecer a autonomia política e econômica brasileira. c) Criar uma monarquia constitucional em Portugal. d) Trazer a família real de volta a Lisboa. e) Limitar os poderes do rei.
2. A volta de Dom João VI para Portugal em 1821 foi consequência direta: a) Do desejo do próprio rei em retomar o trono em Lisboa. b) Da declaração de independência feita por Dom Pedro. c) Da pressão exercida pela Revolução Liberal do Porto. d) De um acordo comercial com a Inglaterra. e) De uma rebelião popular ocorrida no Rio de Janeiro.
3. A famosa frase "Como é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou pronto: diga ao povo que fico" está associada: a) Ao Grito do Ipiranga. b) À coroação de Dom Pedro I. c) À abertura dos portos. d) Ao Dia do Fico. e) À Revolução Liberal do Porto.
4. A principal consequência do "Dia do Fico" (9 de Janeiro de 1822) foi: a) O imediato reconhecimento da independência pela Inglaterra. b) O início de uma guerra civil entre brasileiros. c) A expulsão de todas as tropas portuguesas do território. d) A ruptura definitiva e aberta entre Dom Pedro e as Cortes Portuguesas. e) A abdicação de Dom Pedro I ao trono brasileiro.
5. As Cortes Portuguesas reagiram ao Dia do Fico: a) Concordando com a decisão e nomeando Dom Pedro como Imperador. b) Ignorando o fato, pois consideravam Dom Pedro um governante insignificante. c) Cortando o diálogo e classificando o ato como uma rebeldia. d) Enviando mais tropas para apoiar o governo do Príncipe Regente. e) Propondo um novo acordo comercial com o Brasil.
6. O fato histórico que precipitou o grito de independência de Dom Pedro às margens do Ipiranga foi: a) A notícia de que a Bahia havia sido conquistada pelos portugueses. b) A chegada de uma nova carta das Cortes que anulava seus atos e exigia seu retorno. c) A pressão da princesa Leopoldina para que ele proclamasse a independência. d) Um ultimato da Inglaterra para que o Brasil se tornasse independente. e) A convocação bem-sucedida da Assembleia Constituinte.
7. Sobre o reconhecimento internacional da Independência do Brasil, é CORRETO afirmar: a) Foi imediato por todas as nações europeias, que apoiavam a liberdade das colônias. b) Os Estados Unidos foram os primeiros a reconhecer, seguindo a Doutrina Monroe. c) A Inglaterra reconheceu primeiro, mas impôs condições financeiras e comerciais ao Brasil. d) Portugal reconheceu a independência pacificamente no dia seguinte ao 7 de setembro. e) A França liderou o reconhecimento europeu sem exigir qualquer contrapartida.
8. A participação da Inglaterra no processo de independência brasileiro foi motivada principalmente: a) Por ideais liberais e de apoio à autodeterminação dos povos. b) Pelo desejo de anexar o território brasileiro ao seu império. c) Por seus interesses econômicos e na expansão de seu mercado consumidor. d) Pela rivalidade histórica com Portugal. e) Pela pressão dos Estados Unidos para que mediasse o conflito.
9. A independência do Brasil é considerada "conservadora" porque: a) Foi uma revolução popular que derrubou a monarquia. b) Aboliu imediatamente a escravidão e redistribuiu terras. c) Manteve a estrutura social e econômica baseada na monarquia, latifúndio e escravidão. d) Foi liderada pelos setores mais pobres da população. e) Copiou o modelo republicano e federalista dos Estados Unidos.
10. Qual foi o papel de José Bonifácio de Andrada e Silva no processo de independência? a) Liderou as tropas portuguesas contra Dom Pedro. b) Foi o principal articulador político, tornando-se ministro de Dom Pedro. c) Proclamou a república em Pernambuco antes do 7 de setembro. d) Representou os interesses das Cortes Portuguesas no Brasil. e) Foi o embaixador que negociou o reconhecimento com os EUA.
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