A Guerra do Contestado
No final do século XIX, na passagem do império para a república, ainda predominavam no Brasil características econômicas herdadas da época colonial: latifúndio, monocultura e técnicas rudimentares de produção. A abolição da escravidão, em 1888, não significou a modernização das relações de trabalho nem a criação de leis de proteção ao trabalhador.
Um país marcado pela pobreza e pela desigualdade social
Sem ver soluções para os seus problemas, parte da população se apega as palavras de conforto, pregações compartilhadas por alguns religiosos e profetas.
No contexto do messianismo, o Monge João Maria de Agostini (1º monge João Maria).
A Guerra do Contestado, o que foi? Quais os motivos? Quando? Onde?
Em uma área então disputada judicialmente entre os estados do Paraná e Santa Catarina, ocorreu a Guerra do Contestado (1912-1916), a maior guerra civil do Brasil republicano.
Motivos para o conflito
Entre o final do século XIX e o início do XX, essa região era habitada por muitos pequenos agricultores e posseiros, entre eles negros, indígenas e brancos, chamados pelos habitantes das cidades de caboclos. Ao longo dos anos, esses camponeses viram seus territórios serem ocupados por fazendeiros interessados na extração de erva-mate e madeira. A presença de grandes companhias estrangeiras envolvidas na construção de estradas de ferro também reduzia o espaço das lavouras de subsistência das famílias camponesas.
Significado de posseiro
Posseiros da região do Contestado
Após a conclusão das obras do trecho catarinense da Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande, a companhia Brazil Railway Company, que recebeu do governo 15 km de cada lado da ferrovia, iniciou a desapropriação de 6 696 km² de terras (equivalentes a 276 694 alqueires) ocupadas já há muito tempo por posseiros que viviam na região entre o Paraná e Santa Catarina. O governo brasileiro, ao firmar o contrato com a Brazil Railway Company, declarou a área como devoluta, ou seja, como se ninguém ocupasse aquelas terras. "A área total assim obtida deveria ser escolhida e demarcada, sem levar em conta sesmarias nem posses, dentro de uma zona de trinta quilômetros, ou seja, quinze para cada lado". Isso, e até mesmo a própria outorga da concessão feita à Brazil Railway Company, contrariava a chamada Lei de Terras de 1850. Não obstante, o governo do Paraná reconheceu os direitos da ferrovia; atuou na questão, como advogado da Brazil Railway, Affonso Camargo, então vice-presidente do estado.
Brazil Railway Company - empresa responsável pela construção da Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande.
Estrada de Ferro São Paulo - Rio Grande.
Governantes, fazendeiros e empresários querendo tirar os pobres posseiros da região.
Liderança do Contestado e as crenças do movimento
Nesse contexto, surgiram alguns movimentos messiânicos, como o liderado pelo monge João Maria de Agostinho, entre 1843 e 1852; o do monge João Maria de Jesus (foto), nas últimas três décadas do século XIX; e o de José Maria de Agostinho, no início do século XX.
O Messianismo é a crença na vinda ou no retorno de uma pessoa dotada de poderes especiais que trará paz e a prosperidade na Terra, inaugurando uma nova era.
Monge João Maria de Jesus, o segundo a peregrinar pela região do Contestado. Foto de 1898.
Em 1912, o monge João Maria liderou o movimento que culminou na Guerra do Contestado. Seus seguidores acreditavam que o fim do mundo estava próximo e que a adesão ao movimento significaria a salvação da alma.
Monge João Maria de Jesus (segundo monge)
Acreditavam no fim do mundo e que a participação no movimento garantiria a salvação.
Ao grupo de José Maria uniram-se também operários recrutados para a construção da ferrovia que tinham sido demitidos e proibidos de viver às margens da estrada. O anseio dessas pessoas por terra, trabalho e melhores condições de vida associou-se à religiosidade popular, tornando as tensões sociais existentes na região ainda mais explosivas.
Alguns operários demitidos da Brazil Railway Company se juntaram ao movimento do monge José Maria.
O desejo por terras para poderem trabalhar e alcançarem uma qualidade de vida.
A Guerra do Contestado (1912-1916)
O conflito e seu desfecho
Em 12 de outubro de 1912, a guerra eclodiu. O monge João Maria e um grupo de fiéis rumaram até a cidade de Irani, situada hoje no estado de Santa Catarina, principal centro da disputa entre paranaenses e catarinenses.
As autoridades do Paraná, contudo, acreditavam que o grupo tinha sido enviado pelo governo de Santa Catarina e, assim, iniciaram uma violenta repressão, que culminou com a morte de José Maria.
A morte do monge
A crença de que o monge ressuscitaria levou ao surgimento das “cidades santas”, comandadas por meninas que diziam ter visões e receber instruções de José Maria. Inicialmente religioso, o movimento tornou-se cada vez mais político. Os rebeldes reivindicavam o direito à terra, ao trabalho e à liberdade religiosa.
Os dois monges José Maria
Estima-se que o exército tenha enviado cerca de dois terços de seu efetivo para a região e equipado as tropas com armas modernas. Em 1915, o cerco ao movimento intensificou-se. A truculência do exército, a falta de alimentos e as doenças enfraqueceram os rebeldes e provocaram o fim do conflito, em 1916, deixando cerca de 20 mil mortos, a maior parte caboclos.
A visão republicana sobre os rebeldes do Contestado
Rebeldes do Contestado
“Por muito tempo o estudo sobre o conflito do Contestado refletiu todos os preconceitos que existem sobre as populações rurais em geral e, em especial, os caboclos. ‘Matutos’, ‘tabaréus’ e outras denominações pejorativas aos habitantes nacionais indicavam uma mistura de preconceito racial (contra negros, indígenas e mestiços) associado ao preconceito urbano e de classe, contra os camponeses em geral. Esta população [...] era tratada como um povo ignorante, [...] despreparado para qualquer política de modernização, preso a superstições [...].
O conceito de ‘fanatismo’, por expressar uma condição mental irracional, um comportamento ligado à loucura, foi a principal saída encontrada por militares, jornalistas e historiadores para montar uma estrutura explicativa ao fenômeno que se desenvolveu no Contestado. [...]
[No entanto, ao ultrapassar as análises estereotipadas] Mais do que entender que os sertanejos reagiram a uma agressão externa, é importante considerarmos que eles não podiam ter sido mais explícitos na formação de um projeto rebelde, de um novo modelo de sociedade. A resistência e a negação do mundo dos coronéis e da empresa ferroviária norte-americana se desenvolveu na invenção de algo absolutamente novo – a ‘Cidade Santa’ [...].”
MACHADO, Paulo Pinheiro. O centenário do movimento do Contestado: 1912-2012 – história, memória e historiografia. Portal de História da UFF. Disponível em <http://mod.lk/EA9B7>. Acesso em 10 dez. 2019.
O Contestado hoje
Boa parte dos descendentes dos rebeldes do Contestado vive hoje em comunidades espalhadas pelo interior de Santa Catarina. Em alguns municípios, como Timbó Grande, onde ocorreu a última batalha do Contestado, 44,2% da população é pobre ou indigente. Segundo o Censo de 2010, 50,4% das famílias têm renda per capita de até um quarto de salário mínimo.
Os moradores dessas comunidades dedicam-se, principalmente, aos cultivos de subsistência e ao trabalho temporário em grandes fazendas ou madeireiras. Com medo de perder oportunidades de trabalho, muitos evitam dizer que são parentes dos rebeldes que lutaram no Contestado.
EXERCÍCIOS
01 - O que foi a Guerra do Contestado?
02 - A região onde ocorreu a Guerra do Contestado era rica em:
03 - Quais estados brasileiros reivindicavam a posse da região?
04 - O que é o messianismo? Baseado na sua resposta, o que é o messianismo político?
05 - Quem foi o monge João Maria no contexto da Guerra do Contestado?
06 - O que os seguidores do monge João Maria acreditavam?
07 - O que os seguidores do monge João Maria desejavam?
08 - Por que existia conflitos entre os posseiros e os grandes fazendeiros da região?
09 - Por que a Brazil Railway Company se envolveu em conflitos de interesses na região sul do país?
10 - Informe três motivos que influenciaram o início da Guerra do Contestado:
11 - Quando e como a Guerra do Contestado começou?
12 - Por que as autoridades do Paraná reagiram de modo violento contra os posseiros?
13 - O que aconteceu com o monge João Maria?
14 - Por que "cidades-santas" surgiram?
15 - Como a Guerra do Contestado chegou ao fim?
16 - Qual era a visão republicana sobre os rebeldes do Contestado?
17 - Como é a região do Contestado hoje?
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